quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Nordestinos, o Brasil em busca de soluções


Vale a pena ver de novo?

O Jornal Nacional da Rede Globo no dia 21 de novembro exibiu mais uma reportagem da série JN no Ar com o repórter Pedro Bassan mostrando os efeitos da seca em diferentes cidades do Nordeste. E qual era a novidade da reportagem. A distribuição de água por carros- pipa? A mortandade dos animais vítimas da sede e fome? A fuga do sertanejo sofrido para outras regiões? A falta de decisões políticas? Qual era mesmo a novidade? Nada disso é novidade, são coisas que acontecem há muitos anos e todas as vezes que o semiárido é atingido por mais um período de seca tudo isso volta à tona. A seca se repete regularmente no Nordeste e quase nada muda. A única novidade na reportagem é a qualidade das imagens que atualmente são exibidas em HD. 
Fonte: Relatório "Nordestinos", Rede Globo/1984
Em 1984, há 28 anos, a Rede Globo primeiro lançou uma campanha Nordestinos, Urgente, que tinha como objetivo a arrecadação de alimentos e água para matar a fome e a sede dos que estavam sofrendo com mais um longo período de seca. Foi uma comoção nacional e toneladas de donativos chegavam ao Nordeste para minimizar, mesmo que temporariamente, a fome e a sede dos nordestinos pobres do semiárido. A equipe responsável pela campanha Nordestinos, Urgente ao avaliar os resultados da mobilização nacional de doações, verifica que são efêmeros, emocionais, assistencialistas e nada mudaria a curto ou longo prazo a situação na região. Ou seja, o problema no Nordeste não seria resolvido apenas com doações de alimentos e água temporariamente, ou com subsídios, com obras emergenciais ou até mesmo com esmolas.

No mesmo ano a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil publica um documento denunciando a miséria, as ameaças constantes de genocídio do povo nordestino, a inoperância das autoridades e dos programas oficiais.
Frente à situação pela qual passava o Nordeste em 1984 a Rede Globo de Televisão lançou o projeto Nordestinos: O Brasil em busca de soluções. E teve o apoio de 11 universidades nordestinas na sua execução. Nessa época eu fazia mestrado em Administração Rural e Comunicação Rural na Universidade Federal Rural de Pernambuco/UFRPE, um das universidades envolvidas no projeto e como aluno fiquei interessado em acompanhar a mobilização liderada pela Rede Globo de Televisão. O projeto teve o seu lançamento em cadeia nacional com o pronunciamento do Arcebispo do Rio de Janeiro Dom Eugênio Sales, nordestino do Rio Grande do Norte, que conhecia os problemas do semiárido. Foram 50 dias de atividades no campo com a participação de professores, pesquisadores e técnicos, das universidades conveniadas, que percorreram 7.700 quilômetros coletando informações sobre os efeitos da seca em oito estados e vários municípios do semiárido. 
Fonte: Relatório "Nordestinos", Rede Globo/1984
O trabalho de campo teve como objetivo coletar testemunhos, opiniões e informações de autoridades e especialmente do povo, mais de seis mil pessoas contaram suas histórias sobre a miséria, a fome e o abandono do semiárido pelas autoridades, sobre as questões da terra e as relações de trabalho, sobre as famigeradas frentes de emergências, sobre o uso da água, das novas tecnologias e dos agrotóxicos, sobre as questões da comercialização e cooperativismo, sobre o crédito agrícola, sobre a educação, a saúde, a nutrição e sobre tantos outros problemas. 
O relatório do projeto Nordestinos: o Brasil em busca de soluções, lá nas suas conclusões afirma:
A população sertaneja está cansada de promessas e frustrações  Quando se fala em falta de decisão política para resolver os problemas urgentes dos sertões, estranha-se. Afinal de contas, nos últimos anos, o Nordeste tem tido um peso politico considerável dentro do partido governista e seus representantes têm ocupado cargos importantes. A Prova dos Nove foi feita: não basta ter representação política formal: é preciso a mobilidade de todos. Sem mobilização democrática não haverá transformação social. Esta é a política que os sertões precisam: participação e cidadania (Projeto Nordestinos: o Brasil em busca de soluções. Relatório de Viagem ao Sertão. Rede Globo, 1984, p. 26). 
   
Nessa nova série de reportagens sobre o Nordeste o Jornal Nacional (TV Globo), agora no dia 26 de novembro, mostrou ao Brasil o desperdício de recursos públicos na tão esperada obra de transposição do Rio São Francisco. O que estamos assistindo no Jornal Nacional é um retorno ao passado e que não é simulacro, não se trata de ficção é a pura realidade. O documento então publicado, há 28 anos atrás, pela Rede Globo e as 11 universidades nordestinas continua atual e os debates sobre os problemas no Nordeste e especialmente no semiárido se repetem. Ou seja, passaram os anos e quase nado mudou e a nossa esperança está na nossa fé, como enfatizou a ministra do Planejamento Miriam Belchior (...) que as pessoas não percam a confiança. Aquele pessoal tem fé. E o que eu posso dizer pra eles é que a água vai chegar, sim, em 2015.
 Ah! Bom, então tá, com fé esperamos.
Agora que se aproxima o fim de 2012, vale a pena ver de novo tudo que o JN nos mostra em rede nacional, a pior seca dos últimos 30 anos. Plimplim!!!

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Os 249 anos da Romaria da Penha

Nos últimos anos venho estudando diferentes festas tradicionais populares brasileiras, religiosas e profanas, no contexto da sociedade midiática e da folkcomunicação com o objetivo de compreender os novos significados dessas celebrações na atualidade.
Há centenas de anos o homem comemora os seus ritos de passagem, relembra as suas datas festivas, sagradas e profanas. Essas evoluções e evocações chegam até os dias atuais incorporadas aos nossos calendários de tradição religiosa e festiva do catolicismo popular no Brasil e especialmente no Nordeste. Ao longo do tempo essas práticas sempre fizeram parte dos processos das transformações culturais e religiosas da sociedade humana, das suas relações simbólicas entre a realidade, a ficção e o lúdico, dando origem aos diversos protagonistas e suas performances nos festejos populares.
As festas populares tradicionais são acontecimentos identificadores dos fatos locais, são celebrações das diversas relações sociais vivenciadas pela comunidade nos territórios sagrados e profanos. O ser humano é um realizador de festas, portanto, a festa é parte essencial para as relações sociais e é através das festas que se divulgam e organizam as suas culturas e as suas memórias. É nas observações e nas interpretações das festas populares que se descobre os códigos, as regras e os estatutos construtores do ensinar e aprender as diversidades da cultura brasileira, consequentemente, o desenvolvimento da identidade de um povo. As festas populares passaram e ainda passam por importantes transformações culturais nos diferentes momentos da história da sociedade. Num passado mais remoto com a instituição da quaresma, depois com as navegações e os grandes descobrimentos de novas terras e na contemporaneidade com a globalização cultural proporcionada pelas novas tecnologias da comunicação, dos negócios do turismo e dos acontecimentos midiáticos.
Neste final de semana acontece uma das mais importantes festas populares tradicionais da Paraíba, a Festa da Penha com os seus 249 anos de história e devoção demonstrada pelos mais de 300 mil fiéis, conforme estimativa da Policia Militar, que em romaria saem da Igreja de Nossa Senhora de Lourdes na noite do sábado (24), num percurso aproximadamente de 12 quilômetros, rumo ao Santuário de Nossa Senhora da Penha, localizado na praia do mesmo nome, e chegada prevista na madrugada do domingo. São inúmeros os devotos que caminham rumo ao santuário levando as suas oferendas para depositarem na Sala dos Milagres em agradecimento a Nossa Senhora da Penha pela graça alcançada. Ou seja, entregam o ex-voto que é a materialização da promessa cuja graça foi alcançada. O ex-voto significa o agradecimento do fiel a um Santo ou Santa pela cura de doenças, de vícios, pelo casamento, por conseguir emprego, ter passado de ano nos seus estudos, por adquirir uma casa, um carro ou uma moto e tantas outras coisas.
Enfim, o pagamento de promessa é uma manifestação de caráter religioso vinculada a uma atividade extraordinária daquilo que foge às práticas da vida cotidiana, materializando os pedidos através de representações em artefatos de cerâmica, de gesso, de parafina, ou em formas de cartas, bilhetes, fotografias, pinturas, desenhos, e  orações publicadas nos jornais e outras diversidades de manifestações artísticas culturais.
O pagamento de promessas através de ex-votos é uma prática universal cujas origens se perderam no tempo, porém, sabe-se que os povos do Mediterrâneo 3000 anos a.C. já ofertavam objetos e animais às divindades como forma de agradecimento por uma graça alcançada. Portanto, o ex-voto depositado em algum lugar considerado sagrado pelo devoto é uma forma prática de pagamento de uma graça alcançada, mas cada expressão, cada conteúdo transportado em cada uma de suas formas antropomorfas (representações do corpo humano ou de parte dele), zoomorfas (as representações de animais ou parte deles) e outras formas de representações (de pessoas ou coisas através de fitas, velas, vestuários, mechas de cabelo, peças utilitárias de uso doméstico, aparelhos ortopédicos, fotografias, cartas, publicações em jornais) são fontes de informação da cultura de um povo que deve ser estudado para uma melhor compreensão das superações de diferentes dificuldades por que passa determinada comunidade. Os ex-votos são indicadores que certos problemas foram solucionados ou desejos realizados, como a cura de uma doença, a aquisição de casa ou de outro bem como carro, moto e tantos outros. 
O ex-voto é muito mais do que um bem cultural material ou imaterial de significado de pagamento de promessa, também é necessário se considerar os seus valores antropológico, etnográfico, estético e, como veículo de comunicação popular – processos folkcomunicacionais – são importantes portadores de informações e de opiniões das populações rurais e urbanas brasileiras e, sem dúvida, uma das mais expressivas formas de comunicação popular brasileira que resiste ao tempo e espaço no contexto da sociedade midiatizada.
A Romaria de Nossa Senhora da Penha aqui em João Pessoa, mesmo com a globalização cultural, é um importante exemplo de que a devoção popular e a tradição da festa religiosa e profana não se acabam com as novas significações culturais midiatizadas pelas novas tecnologias da comunicação. A revitalização das festas tradicionais é mais uma demonstração que a cultura popular não só é de resistência ao tempo, mas também de interpelação e de incorporação, em diferentes estâncias de espaços, de valores das culturas contemporâneas. Melhor dizendo ao invés da tão propagada visão apocalítica de alguns que pregam o fim das manifestações tradicionais populares, provocadas pela globalização, assistindo na atualidade o ressurgimento dessas manifestações tradicionais e mais uma vez digo o exemplo é a Romaria da Penha que em 2013 completa 250 anos e com certeza mais viva e forte porque esse é o desejo do povo devoto de Nossa Senhora da Penha.




quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Hoje aos 65 anos



Hoje completo 65 anos de vida e bem vivida nos diferentes campos de experiências de quem nasceu em Patos, no sertão seco, mas festivo e solidário,  de quem passou toda a infância e adolescência entre Patos e a Paria do Poço, aqui em Cabedelo. Foram experiências, tempo e espaço do sertão e tempo e espaço do litoral, que me ajudaram, e muito, a consolidação da minha vida de adulto. Agora estou em pleno direito de gozo das garantias do Estatuto do Idoso, ainda pouco respeitado, mas hoje conquisto esse direito pleno.
São 65 anos, bem vividos e que agradeço a Deus, aos meus pais Carlos e Leonor e titia Amélia (in memória), aos meus irmãos e irmãs, também a Mário e Alberto (in memória), aos meus amigos, agradecer a Rosinha companheira de 34 anos, aos meus dois filhos Antonio Carlos e Osvaldinho.
Aos 65 anos não poderia deixar, mais uma vez de agradecer a Deus por ter me dado a felicidade de ter um neto. Obrigado Cindy, obrigado Antonio Carlos pelo nosso querido Rafael. São 65 anos vividos intensamente e hoje resolvi também fazer uma surpresa tirando, temporariamente da minha vida, a outra minha companheira de 40 anos, a minha barba, curtida com muito carinho.
Até logo minha barba, estou aguardando você de volta nesses próximos dias.

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

O dia do professor e a federalização do ensino básico


Jesus, Maria e José!!!
Quase me passou despercebido que o dia 15 de outubro é o dia do professor, é feriado escolar, até porque na mesma data se comemora, também, o dia do comerciário e aí realmente para quase tudo: shopping, as lojas de grandes e pequenos negócios, supermercados, etc. A convergência das duas celebrações com o comércio e a escola fechada fica parecendo com o feriado da Sexta-Feira Santa, ou seja, quase tudo parado. Mas, não sei por que só vinha na minha cabeça o feriado do comerciário e logo eu um professor aposentado com mais de 30 anos de atividade na universidade quase esqueci o dia do professor.
Mas, foi o pronunciamento do senador Cristovam Buarque na tribuna do Senado que me fez lembrar o dia do professor. O senador falou mais para os telespectadores da TV Senado do que para os seus pares, mas falou com toda a convicção do seu projeto de federalização do ensino básico, na melhoria salarial e das condições de trabalho do professor. No seu pronunciamento o professor e senador fez comparações do ensino no Brasil com outros países de economia e renda próximas ou mesmo inferiores a nossa, mas que destinam mais recursos e melhores políticas de ensino/educação.
O projeto de lei do senador, o PLS 320/08, que tramita na Comissão de Educação do Senado prevê a criação da Carreira Nacional do Magistério e o salário de nove mil reais para professores e aumento de gastos por aluno. É sem dúvida um projeto importante para a melhoria quantitativa e qualitativa da educação do Brasil e que prevê ao longo de 20 anos uma verdadeira revolução civilizatória do país.
Jesus, Maria e José, se não fosse esse pronunciamento do professor senador teria esquecido do dia da minha categoria! 

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Radiotevê: a Nova Era do Rádio aos 90 anos

Acervo Pessoal
Uma das grandes revoluções da comunicação mundial foi o surgimento do rádio no início do século 20 com a histórica transmissão em 1901 entre a Europa e os Estados Unidos. Nos anos 30 do século passado o rádio já era um importante veículo de propaganda política usado pelo Presidente dos Estados Unidos Franklin Roosevelt, por Hitler na Alemanha e por tantos outros. Nos anos 40 e 50 do mesmo século o rádio consolidava-se como importante veículo de comunicação em várias partes do mundo.

Caubi Peixoto (acervo pessoal)
A primeira experiência de transmissão radiofônica no Brasil ocorreu em 1922, nas comemorações do centenário da independência com o pronunciamento do então Presidente Epitácio Pessoa. Mas, o Brasil entra, verdadeiramente, na Era do Rádio no período do Estado Novo que vai de 1937 a 1945 quando Getúlio Vargas cria o Departamento de Imprensa e Propaganda-DIP. Até meados da década de 1960 o rádio viveu o período denominado da Era de Ouro e a partir daí, começa a perder audiência para a televisão quando é anunciada a morte do rádio para esse novo veículo de comunicação que tinha som e imagem e o rádio seria passado para trás, diziam que não haveria mais espaço para o rádio.
Emilinha Borba (acervo pessoal)
O rádio recebeu anúncio de morte em diferentes épocas da sua história, sempre sobreviveu e agora está mais vivo do que nunca. Com o surgimento da televisão a Era de Ouro do Rádio passou a ser a era da TV e mais uma vez a morte foi anunciada como quadro irreversível. Era a sua morte cerebral, a sua morte tecnológica, os conteúdos e os profissionais seriam transferidos para o novo veículo de comunicação que empolgava o Brasil. Os anos se passaram e mais uma vez o rádio saiu da UTI.

Jornal Gente com Joelmir Beting, Rafael Colombo e Salomão Ésper
A chegada da internet populariza ainda mais a televisão, melhor dizendo, a TV digital, a TV móvel se espalha em todas as camadas sociais e volta a polêmica sobre a morte do rádio. E o rádio AM/FM se transforma drasticamente, dá o troco, incorpora as novas tecnologias de comunicação, renova os conteúdos e ressurge como um veículo de comunicação para atender as exigências do mercado de consumo emergente no país e ocupa espaços utilizando outras mídias como telefone celular, tablets e outros dispositivos móveis além da TV.
Ao contrário da visão pessimista de alguns, o que estamos assistindo na atualidade é o surgimento de uma nova Era do Rádio onde as convergências de tecnologias e abrangências de conteúdos transformam o rádio em um veículo também com imagem. Ou seja: “radiotevê”. Melhor dizendo, se nos anos 50 e 60 do século 20 tivemos o aparecimento da “tevêradio”, na atualidade está emergindo o “radiotevê”, possibilitado por diferentes suportes tecnológicos e entrando com toda força na era da imagem e do som digital.
O rádio não só se escuta, agora também se pode ver, inclusive o nosso programa preferido, em qualquer parte do mundo. É o rádio híbrido com som e imagem navegando na internet e tantos outros suportes midiáticos. O rádio criou novas linguagens para atender os diferentes segmentos da sociedade independente de idade, gênero, classe econômica e cultural.
Não se justifica mais que o apresentador do programa de rádio diga: pena que não seja TV para o ouvinte ver isso ou aquilo. No “radiotevê” a audiência não é mais só de ouvintes, é ao mesmo tempo de ouvintes e telespectadores. Isto é, os constituintes da audiência dos programas radiofônicos não são mais só ouvintes, agora são “teleouvintes”, e realmente é um novo prazer, uma redescoberta ouvir e ver esse rádio que se espalha mundo afora. O “radiotevê” prolifera nas diferentes redes para atender a sociedade midiatizada que cada vez mais  está disponível para a maioria dos brasileiros.
Apresentadores Josival Pereira e Cláudia Carvalho (João Pessoa/PB)
O “radiotevê”, na sociedade atual passa a ser um importante veículo folkcomunicacional porque está ao alcance das diferentes localidades e das diferentes classes sociais desse imenso país.   Portanto, em 2012 o Rádio completa 90 anos de vida no Brasil e mais forte do que nunca.
Nem Roquete Pinto imaginaria tanto. Parabéns ao jovem rádio brasileiro.








domingo, 24 de junho de 2012

Repercussão do post A Festa dos Bugios


O artigo “A Festa dos Bugios: uma celebração carnavalesca do São João em Portugal” tem repercussão internacional e é destaque no Blog oficial da Casa dos Bugios.
O professor doutor, pesquisador e dirigente da festa de Sobrado, Manuel Pinto, destaca: "Talvez a mais extraordinária Festa de São João e uma das mais expressivas manifestações da cultura popular portuguesa" - é assim que classifica a Festa de Bugios e Mourisqueiros um dos maiores actuais especialistas de culturas populares do Brasil, que esteve em Sobrado na festa de 2011.”

quinta-feira, 21 de junho de 2012

Quadrilhas Juninas e as Festas dos Santos Populares

Chega a época das festas juninas no Brasil e continua a polêmica sobre as apresentações das quadrilhas nos festivais e encontros promovidos por órgãos públicos ou privados, se são tradicionais, se são estilizadas, se estão mais parecidas com as escolas de samba do Rio de Janeiro ou mesmo com blocos de carnaval. Não importa o que seja, mas que são apresentações que atraem público, elevam a autoestima dos seus brincantes, na maioria jovens que moram nas periferias das grandes cidades, disso tenho certeza, principalmente, depois que venho observando a evolução desses grupos organizados para celebrar os santos populares do mês de junho: São Antônio, São João e São Pedro.   
Os festivais, os encontros de quadrilhas juninas se espalham por quase toda a região nordestina como um novo espetáculo e todo o espetáculo tem três componentes fundamentais: o espaço, o tempo e o movimento de apresentação. Mas, na sociedade contemporânea emerge um quarto componente importante, o midiático, que quase sempre determina um novo espaço, um novo tempo e um novo movimento para as apresentações dos espetáculos, especialmente para as transmissões da televisão ao vivo, aliás, isso acontece no carnaval do Sambódromo, no festival do Boi em Parintins, na festa de Rodeio em Barretos e em tantas outras festas populares brasileiras.

Evidentemente as festas juninas no Nordeste não poderiam ficar de fora do jogo de interesse da mídia e principalmente da televisão.  Antes de criticar as atuais quadrilhas é necessário conhecer quais são as origens das nossas festas populares, de onde vieram as nossas manifestações culturais tradicionais, como surgiram na Península Ibérica e como chegaram no Brasil. São questionamentos que necessitam de melhores reflexões dos estudiosos, dos pesquisadores e dos agentes responsáveis pela administração das políticas públicas para as culturas tradicionais, por que o povo está interessado mesmo é em festejar e celebrar esses santos populares. 

Sabe-se, através da história, que na Idade Média os povos celebravam festas para os deuses pagãos nas mudanças das estações do ano, no antigo Egito em homenagem a deusa da castidade Isis, em Roma ao deus do vinho Baco e assim foram se espalhando as festas dionisíacas, lupercais, saturnais, charivaris ou assuadas que eram festas com suas inversões dos valores morais, com os cortejos jocosos, das alegorias e das extravagâncias. Ou seja, as festas das mudanças de estações do ano, que predominaram na Europa Antiga por longos períodos, quase sempre foram espetáculos de carnavalizações, das fantasias grotescas, com muitas cores, irreverências e de personagens patéticas. A passagem da primavera para o verão é a melhor época para a colheita das plantas mágicas com seus poderes de cura e nesta agenda de festividades, das crenças populares estavam as comemorações ao solstício de verão no hemisfério norte e aqui chegavam  com os colonizadores em forma de festa religiosa e profana não mais para comemorar a mudança de estação, achegada do inverno no hemisfério sul, que sempre ocorre entre os dias 20 e 24 de junho, mas para celebrar os santos católicos: Santo Antônio, São João e São Pedro. 

Portanto, não basta fazer crítica, é necessário entender a evolução das nossas festas populares, situá-las nos diferentes contextos socioeconômicos, nos espaços/tempos/movimentos do público e privado, da casa e da rua, cada vez mais influenciada pela sociedade midiática. Com a globalização cultural ao invés da propalada extinção das culturas tradicionais o que estamos vendo são suas ressignificações para atender as demandas de consumo de bens culturais, para o turismo e para a mídia, com suas formas hibridas do global/local. Aqui chamo atenção para as quadrilhas juninas como um espetáculo popular em evolução, com torcidas organizadas e que atraem grandes públicos nas suas apresentações.

Este ano o concurso de quadrilhas juninas de João Pessoa ocorre na praça Dom Adauto, mais conhecida como a praça do Bispo. Durante três noites mais de 20 grupos se apresentam e as três primeiras classificadas disputam o campeonato paraibano que será realizado no Parque do Povo, em Campina Grande.

E em festejos juninos não pode faltar forró nos seus diversos gêneros: pé-de-serra, universitário, de plástico e eletrônico entre outros. É nesse “ritmo” que participarei da banca examinadora da defesa de dissertação da mestranda Libny Silva Freire na Universidade Federal do Rio Grande do Norte.


quinta-feira, 14 de junho de 2012

A Festa dos Bugios: uma celebração carnavalesca do São João em Portugal

Cartaz da Festa "Bugiada 2011"
A origem das festas juninas tem como base duas hipóteses defendidas por folcloristas e outros estudiosos. 

Uma é a sua vinculação direta à celebração do nascimento de São João Batista, filho de Zacarias e Isabel, precursor do Messias. 

A outra hipótese, à qual nos associamos, é a sua vinculação com as festas de origem pagã na Idade Média, pela celebração da chegada do verão no Hemisfério Norte, o solstício de verão.

Acompanho há vários anos essa polêmica entre a tradição e a modernidade dos festejos juninos no nordeste brasileiro, principalmente sobre a evolução das quadrilhas que estão cada vez mais parecidas com as escolas de samba do Rio de Janeiro e então resolvi conhecer de perto as raízes Ibéricas da festa de São João para melhor compreender tudo isso. 

Quem tem razão? As nossas festas estão realmente perdendo as suas tradições? A globalização e consequentemente a mídia são responsáveis por todas essas modificações? Para verificar tudo isso fomos a Portugal, em junho de 2011, para observar as festas de Santo Antonio, São João e São Pedro e fiquei impressionado com a participação popular nas celebrações dos três santos do mês de junho em todo o país. É realmente uma das maiores festas populares dos portugueses, tão grande ou maior que o carnaval. 

Marchas de Lisboa
Marchas de Lisboa
Em Lisboa a Festa de Santo Antonio com as Marchas Populares em grande desfile na Avenida da Liberdade, uma das mais importantes avenidas da capital portuguesa, é um acontecimento midiático transmitido ao vivo pelas principais redes de televisão com a participação das celebridades do mundo artístico que se misturam com a maioria de anônimos que fazem o espetáculo assistido por milhares de pessoas que se espalham pelas ruas da cidade. O Santo Antonio é comemorado nos diversos bairros com muita música, com forte influência da música brasileira, as tradicionais sardinhas assadas na brasa, broas de milho e vinho. Pudemos observar na Mouraria, no Alto do Pina, na Penha de França e em Alfama a demonstração de fé e alegria dos lisboetas para com o santo casamenteiro.


Mas o que mais nos chamou atenção foi a festa centenária dos Bugios do Sobrado, um pequeno distrito do município do Valongo pertencente a região metropolitana do Porto, onde se realiza no dia 24 de junho, talvez, a mais extraordinária Festa de São João e uma das mais expressivas manifestações da cultura popular portuguesa, que ainda não foi descoberta pela mídia e nem pelo turismo.
Bugiada 2011

Foi observando essa festa que passamos a compreender melhor o que está acontecendo na atualidade com as nossas festas juninas aqui no nordeste brasileiro e as suas transformações ou ressignificações, para atender as novas demandas de consumo do mundo globalizado.
Bugiada 2011


Na festa de São João do Sobrado há uma representação da luta entre mouros (os Mourisqueiros) e os cristãos (os Bugios), que desfilam pelas ruas da localidade em ritmos de marchas marciais. É uma batalha entre o bem (os cristãos) e o mal (os mouros) e como sempre nessa luta o bem vence o mal.

Na Idade Média as festas de mudanças de estação do ano eram festas carnavalescas, dos muitos mascarados que saiam às ruas praticando desordens e desrespeito às autoridades locais e tudo isso com permissão da sociedade. 
Bugiada 2011 - Mundo pelo avesso


Era a festa do mundo pelo avesso, a inversão do homem que andava no animal de costas segurando a cauda do burro, inversão do sexo, ou seja, homem vestido de mulher e mulher vestida de homem. No período dessas festas quase sempre a liberdade sexual era permitida, ou seja, valia quase tudo que não estava na ordem do dia. 
Mascarados na  Bugiada 2011

Mascarados na Bugiada 2011

É a experiência dos diferentes mundos que aflorava com maior intensidade assim como o mundo maravilhoso da Cocanha ou de São Saruê como bem relatou em versos o poeta popular paraibano Manoel Camilo. Melhor dizendo as festas das mudanças das estações do ano, mesmo que sazonalmente, eram demonstrações de contestação ao cotidiano, das críticas sociais, dos protestos as elites políticas em que o povo contrariava as determinações da Igreja. 

Corso da Bugiada 2011


Os festejos populares da estação de verão, no mês de junho no Hemisfério Norte, na Idade Média eram celebrações vinculadas aos festejos carnavalescos, principalmente as festas de Corpus Christi e São João Batista.
Na Festa dos Bugios do Sobrado em Portugal, que fica a 15 quilômetros da cidade do Porto, o que assistimos foi uma festa rural de celebração do dia de São João com fortes características dos festejos carnavalescos da Idade Média. 












Mourisqueiros da Bugiada 2011
Também na festa do Divino Espirito Santo em Pirenópolis, no Estado do Goiás/Brasil, agora no mês de maio de 2012, pudemos observar o uso de máscaras, a saída de blocos e troças que desfilavam pelas ruas da cidade com muita algazarra e críticas às autoridades civis e religiosas. 
Cavalhadas 2012


No Cavalhódromo, que fica no centro da cidade de Pirenópolis, assistimos as tradicionais e belas Cavalhadas que simbolizam a luta de mouros (o mal) e cristãos (o bem), os cordões azul e encarnado, uma batalha imaginária cujo objetivo se assemelha ao que acontece na festa centenária dos Bugios de Sobrado em Portugal. 
Melhor dizendo, na luta entre mouros e cristãos em ambas as festas o bem vence o mal, de acordo com a simbologia cristã do mundo ocidental. 
Mascarados na Festa do Divino 2012
Mascarados na Festa do Divino 2012























Assim podemos dizer que tanto as festas juninas como as festas de Corpus Christi tem as suas origens nas festas carnavalescas da Idade Média de celebração da chegada do verão no Hemisfério Norte e que chegaram com os colonizadores já adaptadas conforme determinava a religião cristã.


Mascarados na Festa do Divino 2012
E aqui vai uma pergunta, não como provocação, mas para uma melhor reflexão. Será que as transformações das nossas festas juninas e suas aproximações com as festas carnavalescas na atualidade não seriam uma reaproximação com o mundo das experiências originárias da Idade Média, mesmo que inconscientemente? Para nós que pesquisamos as manifestações das culturas populares no contexto da folkcomunicação o importante é compreender as mediações nas diferentes instâncias da sociedade e como operam os ativistas midiáticos no processo de negociação da realização da festa de São João na atualidade.  Viva o São João do  jeito que o povo gosta.
Procissão de São João na Bugiada 2011
Fotos: Osvaldo e Rosa Trigueiro