É o mais recente livro do
padre, teólogo e vice-reitor da Universidade Católica Portuguesa José Tolentino
Mendonça, um especialista em estudos bíblicos que vem publicando com sucesso em
Portugal, artigos e livros sobre uma visão contemporânea das relações entre o
cristianismo e a cultura. O livro foi editado em 2014 pela Paulinas Editora, em
Portugal.
Estava em Portugal e como fazia diariamente
lia os principais jornais, é essa mania de professor, de jornalista que, mesmo
aposentado, busca informações dos fatos locais e do mundo. Quando li no jornal “PÚBLICO”,
do dia 6 de outubro de 2014, uma entrevista com o escritor José Tolentino Mendonça,
sobre essa nova visão da religião, da igreja pela fé mística, fiquei muito
impressionado e interessado em conhecer melhor o pensamento do autor do livro, A Mística do Instante: o tempo e a promessa.
Não tive dúvida saí de
casa só com a intenção de comprar o livro e como estava em Fátima foi muito
fácil, logo na primeira livraria encontrei e para não perder tempo fui até uma
tasca, ali bem próximo ao Santuário, sentei pedi uma taça de vinho da casa,
azeitonas, queijos e pão e comecei a ler, parece que tinha adivinhado foi uma combinação
perfeita degustar o livro acompanhado com vinho, queijo, azeitona e pão. O
livro é uma caminhada, um itinerário teológico sobre os sentidos naturais e os
sentidos espirituais, o tato, o paladar, o olfato, a audição e a visão e a importância
de cada um desses sentidos para uma reflexão do texto bíblico, até porque,
segundo o autor, não há os sentidos
espirituais, de um lado, contraposto aos sentidos naturais, de outro.
A leitura do livro é agradável,
nos leva a compreender melhor os sabores da vida cotidiana e as nossas relações
com o Evangelho. E logo no início o autor chama atenção para duas questões, a primeira
quando diz: Para alcançar o divino a alma
tem de mergulhar na própria alma”. A
alma que não é apenas a parte interior do corpo, mas que está ligada na maneira
de ver, de pegar, de cheirar, no diálogo com os outros e nos sabores que
aproximam Deus do seu povo pelas diferentes instâncias místicas da fé e das
experiências do mundo; a segunda, quando ele diz: O divino é o mistério. A via para ele passa por desligar-se do mundo,
do mundo habitual e quotidiano, e reentrar no espaço interior, esse sim, a
morada que guarda Deus religiosamente. A referência não é de uma religião,
de uma igreja somente filosófica, mas de uma religião e de uma igreja
construídas por andarilhos, por romeiros, por viajantes e mestres mais próximos
da vida cotidiana do homem comum, assim como é desejada pelo papa Francisco.
São questões simples,
mas que nos levam a pensar o nosso interior como sujeito autêntico e socialmente
coletivo de compartilhamento com a nossa fé. O livro é uma caminhada, página por
página, de reflexão sobre a vida cada vez mais artificial, do afastamento do
homem da natureza, da fadiga exigida pela sociedade moderna, mas também das
possíveis saídas para uma vida melhor comunitariamente no espaço e no tempo da
religião e da cultura. Ou seja, Um dos aspectos
centrais da mística do instante é a conversão da nossa relação com o tempo. Como
construiremos o presente e o futuro? O nosso espaço e o nosso tempo vivido? Que
resposta podemos dar a tudo isso? Vivemos, uma crise da competição, do consumo
e do endividamento, da separação do amor do conhecimento, da incompreensão e da
intolerância com o outro. Em, A Mística do Instante: o tempo e a promessa,
com certeza vamos encontrar as
respostas para algumas dessas questões.
Todos os sentidos têm
importância significativa no itinerário teológico desenvolvido, mas foi o
capitulo Buscar o infinito sabor que
mais me chamou atenção quando o autor faz uma caminhada de diferentes sabores
que nos levam a conhecer com maior profundidade o texto bíblico, melhor
dizendo, a revelação bíblica também se
apreende comendo. E a sua leitura constitui uma minuciosa iniciação aos
sabores: ao recôndito sabor do leite, e do mel, ao sabor do trigo tostado, ao
motivo trânsfuga dos ázimos, ao riso iluminado que o manjar pascal desperta.
Vamos conhecer em Sabor
das origens a comida tradicional de uma localidade de uma família; em a Bíblia
contada pelos sabores o autor fala da nossa relação com o texto sagrado; mais
adiante sobre o Pão de mil sabores; dos Sabores de Deus; Um novo protocolo em
redor da mesa; Bom domingo e bom almoço;
comenta a importância da frase com que o
papa Francisco se despede dos fiéis reunidos para Angelus em cada domingo na
Praça São Pedro no Vaticano; Quando não comer é uma oração; aqui José Tolentino
relata os significados do jejum e assim vai interpretando a Bíblia e os
diferentes sabores no contexto bíblico e os seus ensinamentos para as práticas
da vida cotidiana.
A leitura do livro nos
leva a refletir o texto bíblico no tempo e espaço da mesa onde as refeições são
atos performativos não só de comida, mas também das palavras e como local de
conversação. As celebrações religiosas na cultura ocidental quase sempre
terminam com festa na grande mesa, onde se confraternizam todos inclusive os publicanos e pecadores. Assim como diz o
autor: Literalmente, a Bíblia é para
comer. É odorosa, recôndita, vasta como a mesa celeste, íntima como a mesa
materna, grata ao paladar, engenhosa, profusa, profícua.
O tema do livro não é
gastronomia é religião mesmo, mas é uma leitura cheia de sabores para melhor
degustarmos a compreensão da fé mística no século XXI. Boa leitura.