terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

Vivendo e aprendendo nos carnavais com Roberto Benjamim


"Ô ô ô saudade
Saudade tão grande
Saudade que eu sinto
Do Clube das Pás, do Vassouras
Passistas traçando tesouras
Nas ruas repletas de lá
Batidas de bombos
São maracatus retardados
Chegando à cidade, cansados,
Com seus estandartes no ar.
Que adianta se o Recife está longe
E a saudade é tão grande
Que eu até me embaraço
Parece que eu vejo
Valfrido Cebola no passo
Haroldo Fatia, Colaço
Recife está perto de mim".

(Frevo nº 1 do Recife/Antônio Maria)
(Interpretação:Coral Madeira de Lei)

Hoje logo cedo, como sempre faço, liguei o rádio e estava tocando o "Frevo Nº1 do Recife" do compositor e poeta Antônio Maria. Aí bateu uma saudade danada dos carnavais dos anos 70 e 80, quando ainda morava no Recife e quando conheci o professor Roberto Benjamim, meu professor no curso de jornalismo da Universidade Católica de Pernambuco. Aí, também bateu uma saudade danada desse professor, do pesquisador e do grande amigo Roberto que me ensinou quase tudo que sei das nossas festas populares, do nosso folclore, inclusive do carnaval.
Por muitos anos Roberto estudou com muito critério a história e as transformações do carnaval do Recife, de Pernambuco e porque não dizer do carnaval da Paraíba e do Brasil, no contexto da sociedade midiática.  Bateu uma saudade danada das nossas caminhadas de campo observando as festas populares do carnaval nas áreas urbanas, rurais e rurbanas do litoral norte de Pernambuco e o litoral sul da Paraíba, em busca dos caboclos de lanças dos maracatus, dos caboclinhos das tribos indígenas, dos papangus, dos ursos e bois de carnaval, dos blocos e troças, dos homens vestidos de mulher e de tantas outras brincadeiras do carnaval. Ou seja, do carnaval do jeito que o povo faz.
Era uma maratona de 10 a 12 horas por dia do domingo à terça de carnaval, observando e documentando tudo que nos interessa. Nos saíamos, eu e Rosinha e às vezes alguns alunos, daqui de João Pessoa para o litoral sul da Paraíba, passando pelo Conde, Pitimbu, Caaporã, Alhandra, Pedras de Fogo e, Roberto com a sua equipe saía do Recife, passando por Aliança, Carpina, Timbaúba, Araçoiaba e o nosso encontro era em Goiana já no final da tarde do domingo. Voltávamos até Araçoiaba para observar "A Trincheira do Maracatu Cambindinha" comandado pelo mestre Dédinha, que é sem dúvida uma das mais importantes manifestações dos maracatus de Pernambuco. E assim, durante mais de 15 anos realizamos importantes pesquisas empíricas e tudo sempre coordenado por Roberto Benjamin.
E foi assim durante anos, quando poucos ou quase nenhum pesquisador das universidades se interessavam pelo carnaval rural ou das pequenas cidades interioranas que estavam fora dos acontecimentos midiáticos. Nesta época Roberto Benjamin já realizava observações, registros e publicações sobre as transformações dos festejos carnavalescos urbanos e rurais na divisa dos dois estados, refletindo sobre as suas transformações influenciadas pela globalização da comunicação.
Cada caminhada, cada observação do carnaval era um novo aprendizado. E por muito tempo o trabalho de pesquisa desenvolvido por Roberto Benjamim foi ignorado pela universidade e por colegas seus, que achavam que o carnaval não era manifestação artística e cultural merecedora de espaços de estudo na academia.
Roberto Benjamin, às vezes se queixava da falta de interesse, de colegas seus e de alunos, sobre as pesquisas na área da Folkcomunicação cujo objeto de estudo é a cultura popular e o nosso folclore no campo comunicacional, mas nunca pensou em desistir e sempre acreditou no que fazia. Posso dizer que passei por esses mesmos problemas quando iniciei as minhas pesquisas sobre cultura popular e o folclore na Universidade Federal da Paraíba em meados dos anos 70 do século passado. E assim Roberto persistiu, contra quase tudo e quase todos conseguiu estruturar um grupo de discípulos que se espalharam por várias universidades do pais e no exterior, e que na atualidade estão consolidando as pesquisas da Folkcomunicação.
Eu estou incluído nesse grupo e chegando aos meus 69 anos de vida e mais de 40 anos de estudo e pesquisa da Folkcomunicação continuo aprendendo com Roberto Benjamim.  Aqui, fica esse registro em memória de Roberto, que deixou como um dos seus legados um rico acervo em quantidade e qualidade sobre o "Carnaval do jeito que o povo faz". E não tem jeito, lá vamos nós mais uma vez a campo retomando esses caminhos desbravados por Roberto Benjamim. 
Êita saudade...