Cartaz da Festa "Bugiada 2011" |
A origem das festas juninas tem como base duas hipóteses defendidas por folcloristas e outros estudiosos.
Uma é a sua vinculação direta à celebração do nascimento de São João Batista, filho de Zacarias e Isabel, precursor do Messias.
A outra hipótese, à qual nos associamos, é a sua vinculação com as festas de origem pagã na Idade Média, pela celebração da chegada do verão no Hemisfério Norte, o solstício de verão.
Acompanho há vários anos
essa polêmica entre a tradição e a modernidade dos festejos juninos no nordeste
brasileiro, principalmente sobre a evolução das quadrilhas que estão cada vez
mais parecidas com as escolas de samba do Rio de Janeiro e então resolvi conhecer de
perto as raízes Ibéricas da festa de São João para melhor compreender tudo
isso.
Quem tem razão? As nossas festas estão realmente perdendo as suas
tradições? A globalização e consequentemente a mídia são responsáveis por todas
essas modificações? Para verificar tudo isso fomos a Portugal, em junho de 2011,
para observar as festas de Santo Antonio, São João e São Pedro e fiquei
impressionado com a participação popular nas celebrações dos três santos do mês
de junho em todo o país. É realmente uma das maiores festas populares dos
portugueses, tão grande ou maior que o carnaval.
Marchas de Lisboa |
Mas o que mais nos chamou atenção foi a festa centenária dos Bugios do Sobrado, um pequeno distrito do município do Valongo pertencente a região metropolitana do Porto, onde se realiza no dia 24 de junho, talvez, a mais extraordinária Festa de São João e uma das mais expressivas manifestações da cultura popular portuguesa, que ainda não foi descoberta pela mídia e nem pelo turismo.
Foi observando essa festa que passamos a compreender melhor o que está
acontecendo na atualidade com as nossas festas juninas aqui no nordeste
brasileiro e as suas transformações ou ressignificações, para atender as novas
demandas de consumo do mundo globalizado.
Bugiada 2011 |
Na festa de São João do Sobrado há uma representação da luta entre mouros (os
Mourisqueiros) e os cristãos (os Bugios), que desfilam pelas ruas da localidade
em ritmos de marchas marciais. É uma batalha entre o bem (os cristãos) e o mal (os
mouros) e como sempre nessa luta o bem vence o mal.
Na Idade Média as festas de mudanças de
estação do ano eram festas carnavalescas, dos muitos mascarados que saiam às
ruas praticando desordens e desrespeito às autoridades locais e tudo isso com
permissão da sociedade.
Era a festa do mundo pelo avesso, a inversão do homem que andava no animal de costas segurando a cauda do burro, inversão do sexo, ou seja, homem vestido de mulher e mulher vestida de homem. No período dessas festas quase sempre a liberdade sexual era permitida, ou seja, valia quase tudo que não estava na ordem do dia.
Bugiada 2011 - Mundo pelo avesso |
Era a festa do mundo pelo avesso, a inversão do homem que andava no animal de costas segurando a cauda do burro, inversão do sexo, ou seja, homem vestido de mulher e mulher vestida de homem. No período dessas festas quase sempre a liberdade sexual era permitida, ou seja, valia quase tudo que não estava na ordem do dia.
É a experiência dos diferentes mundos que aflorava
com maior intensidade assim como o mundo maravilhoso da Cocanha ou de São Saruê
como bem relatou em versos o poeta popular paraibano Manoel Camilo. Melhor
dizendo as festas das mudanças das estações do ano, mesmo que sazonalmente, eram
demonstrações de contestação ao cotidiano, das críticas sociais, dos protestos
as elites políticas em que o povo contrariava as determinações da Igreja.
Os festejos populares da estação de verão, no mês de junho no Hemisfério Norte, na Idade Média eram celebrações vinculadas aos festejos carnavalescos, principalmente as festas de Corpus Christi e São João Batista.
Na Festa dos Bugios do Sobrado em Portugal, que fica a 15 quilômetros da cidade do Porto, o que assistimos foi uma festa rural de celebração do dia de São João com fortes características dos festejos carnavalescos da Idade Média.
Corso da Bugiada 2011 |
Os festejos populares da estação de verão, no mês de junho no Hemisfério Norte, na Idade Média eram celebrações vinculadas aos festejos carnavalescos, principalmente as festas de Corpus Christi e São João Batista.
Na Festa dos Bugios do Sobrado em Portugal, que fica a 15 quilômetros da cidade do Porto, o que assistimos foi uma festa rural de celebração do dia de São João com fortes características dos festejos carnavalescos da Idade Média.
Mourisqueiros da Bugiada 2011 |
Cavalhadas 2012 |
No Cavalhódromo, que fica no centro da cidade de Pirenópolis, assistimos as tradicionais e belas Cavalhadas que simbolizam a luta de mouros (o mal) e cristãos (o bem), os cordões azul e encarnado, uma batalha imaginária cujo objetivo se assemelha ao que acontece na festa centenária dos Bugios de Sobrado em Portugal.
Mascarados na Festa do Divino 2012 |
Mascarados na Festa do Divino 2012 |
Assim podemos dizer que tanto as festas juninas como as festas de Corpus Christi tem as suas origens nas festas carnavalescas da Idade Média de celebração da chegada do verão no Hemisfério Norte e que chegaram com os colonizadores já adaptadas conforme determinava a religião cristã.
Mascarados na Festa do Divino 2012 |
Procissão de São João na Bugiada 2011 |
Prezado Osvaldo, a hipótese da dinâmica inconsciente que atualiza o imaginário da Idade Média é ótima. As fotos são descritivas e informativas para nós, leitores. A narrativa textual também nos deixa ambientados nas festas de Portugal e de Goiás (tão perto, tão longe, ao mesmo tempo). Parabéns pelo trabalho.
ResponderExcluirYuji Gushiken (ECCO-UFMT/Cuiabá)
Prof. Trigueiro, que texto interessante!!! A possibilidade de um retorno às origens - ao invés da desconstrução das características da festa original - faz repensar estereótipos construídos. Estaríamos partindo de uma representação para uma 're-apresentação'?
ResponderExcluirUma dúvida: a aproximação quanto às festas carnavalescas da Idade Média estaria "apenas" nos vestes e sentido (máscara, bem x mal, 'desobediência civil'...)? Digo porque, no Brasil, temos quadrilhas 'carnavalescas' e músicas de plástico que, comercialmente, tendem a mostrar mais amplamente o São João. O senhor pôde observar este fenômeno também em Portugal?
Abraço, Júnia.
Amigo... agora és um pesquisador-viajante-prazerosamente-sem-compromisso-com-pontos-a=comprovar... isso sim é o melhor da vida de um pesquisador, o prazer de fazer o que gosta porque gosta! Só para meter minha colher...
ResponderExcluirUma bela comparação das heranças (ou não) que temos e do nosso passado mouro quase esquecido. O cristão todos gostam de lembrar (o bem). Tu falas em transformações das festas juninas e perguntas sobre a aproximação com o carnaval etc. Eu volto a pergunta de outra maneira... será que com a higienização de tudo, até a beleza do profano não está se perdendo em nome da globalização?
Prezado Trigueiro
ResponderExcluirGostei muito de seu artigo sobre a Festa dos Bugios em Portugal. Suas pesquisas das raízes do São João são muito esclarecedoras das nossas manifestações juninas.
Um grande de abraço.
Braulio Nascimento.
De grande serventia na pesquisa. Estamos nesse caminho.
ResponderExcluirGde abç.
Itamar Nobre