Pois é. Hoje é um dia diferente, não necessariamente especial, mas realmente diferente porque hoje é 8 de novembro de 2017. Há 70 anos estava chegando ao mundo na minha querida cidade de Patos era uma primavera sertaneja de 8 de novembro de 1947.
A nossa casa na Rua Pedro Firmino, 110, estava cheia de familiares, amigos e amigas do meu pai Carlos Dantas Trigueiro e da minha mãe Leonor Meira Trigueiro. Naquela época Patos era uma jovem cidade com apenas 44 anos e as mães pariam as suas crias em casa com a proteção de muitas rezas e da competência da parteira. Raramente tinha médico no momento do parto e quando tinha ficava na sala, não entrava no quarto lugar sagrado e reservado só as mulheres que auxiliavam a parteira. O médico só entrava no quarto em situação de extrema emergência. A minha mãe contava que no dia do meu nascimento os médicos de plantão eram Dr. Oscar Vieira e Dr. Severino Araújo e a parteira foi Dona Sebastiana Xavier a quem, por muito tempo, tinha a obrigação de pedir a benção como um gesto de respeito e agradecimento.
E como tudo correu bem com o parto da minha mãe, estou aqui para contar um pouco da minha história de vida iniciada em Patos, a Morada do Sol, lá no sertão paraibano. E nesses 70 anos de vida passei ou fiquei em vários lugares sempre aprendendo ou ensinando alguma coisa a alguém. E por tudo isso agradeço a Deus, a Rosinha companheira de todas as horas por quase 40 anos, aos meus filhos Antonio Carlos e Osvaldinho, ao meu neto Rafa e a minha netinha Manu, as minhas noras Cindy e Larissa pela família que tenho. Agradecer aos meus pais e a minha tia Amélia que me deram régua e compasso para traçar os caminhos percorridos. Hoje, 8 de novembro de 2017, aqui em Manaus com os meus netos, era tudo que desejava para celebrar os meus 70 anos com os melhores presentes que Deus me deu mais recentemente o Rafael e a Manuela. Agradeço a todos os meus familiares e amigos que direta ou indiretamente participaram ou continuam participando da minha vida nos diferentes tempos e espaços dos muitos momentos de alegrias, de felicidades e de alguns momentos de tristezas e até de desenganos como parte da história de qualquer ser humano e comigo não seria diferente. Pois é, eu sou assim também.
Obrigado a todos vocês.
( Aos poucos vou contar a minha história de vida e em breve vem as memórias parte II)
quarta-feira, 8 de novembro de 2017
terça-feira, 24 de outubro de 2017
Minha cidade de Patos e seus 114 anos
Depois de muitos anos ausente passei o feriadão de 7
de setembro deste ano em Patos, minha cidade natal, conhecida carinhosamente
como a “Morada do Sol”. Fui para o casamento de um sobrinho querido, Leonard Trigueiro com Luanna Lima. Como o casamento foi no dia 9 à noite aproveitei o meu
tempo na cidade para reencontrar familiares e amigos, visitar lugares que
fizeram parte da minha infância, da minha adolescência e, porque não dizer, até
mesmo da minha maturidade às vésperas de completar 70 anos.
Pois é, nasci em Patos no dia 8 de novembro de 1947 a
cidade tinha apenas 44 anos e agora no dia 24 de outubro de 2017 chega aos seus
114 anos.
Atualmente a Morada
do Sol é um importante polo socioeconômico do sertão paraibano, localizada a cerca de 300 quilômetros de João Pessoa, a capital do estado da Paraíba, com
mais de 100 mil habitantes. Portando, Patos já não é a mesma cidade onde passei
importante parte da minha vida, evidentemente não poderia ser a mesma cidade
dos anos 50, 60 e 70 do século passado onde vivi intensamente. Patos é atualmente
uma cidade do século XXI em pleno desenvolvimento no sertão nordestino.
O feriadão de 7 de setembro, realmente foi um
reencontro com a minha cidade que já não conhecia tanto assim e, flanando pelas
ruas do centro e da periferia aos poucos fui redescobrindo os lugares que
frequentei por muitos anos. Escolas, igrejas, casas, bares, restaurantes,
clubes, cinemas, sinucas, o antigo cabaré da beira da linha do trem, o Tiro de
Guerra e tantos outros lugares por onde passei e vivi por muitos anos. Mas
alguns lugares marcaram muito a minha vida na cidade entre eles o Colégio
Diocesano, que depois passou a ser o Colégio Estadual, onde aprendi muito do
que sei até hoje, o imponente Colégio Cristo Rei, o Cine Eldorado, Patos Tênis
Clube, o lugar que sediou o Fortelândia e o território onde foi a casa em que nasci
na Rua Pedro Firmino 110.
Não pode deixar de visitar também a Catedral de Nossa
Senhora da Guia, a Cruz da Menina e a Igreja de Nossa Senhora da Conceição, fechando,
assim, o ciclo de reconhecimento dos lugares sagrados e profanos da minha
querida cidade de Patos. Alguns desses lugares já não existem ou porque foram
demolidos ou reformados para outras atividades, mas tudo isso faz parte das
mudanças desejadas na cidade que cresce ordenada ou desordenadamente, que
transforma os seus bens culturais materiais e imateriais e, com o passar do
tempo vão construindo, andaime por andaime, uma outra identidade onde se
mesclam o antigo e o novo nos diferentes espaços e tempos urbanos da pequena cidade,
levando-a à terceira mais
importante cidade do estado da
Paraíba.
Patos cresceu e
continua crescendo estendendo-se para as áreas rurais com as construções de
grandes condomínios e outras edificações como se estivesse emergindo do chão
seco do sertão uma outra cidade no entorno da antiga “Morada do Sol”. É uma
cidade que cresce com vocação de centro
sociocultural importante no semiárido nordestino, favorecido pela sua posição
geográfica que polariza atividades de negócios, de serviços de saúde, de
educação, de cultura e tantas outras para atender vários municípios paraibanos e dos vizinhos estados
de Pernambuco, Rio Grande do Norte e Ceará.
Patos, é um núcleo rurbano atraente, aqui uso o
neologismo de Gilberto Freyre para definir uma sociedade em transição do rural
para o urbano, estrategicamente localizada num centro polo de uma região. Ou seja, um núcleo de convergência de vários
interesses ao mesmo tempo conectado ao mundo globalizado pelas mídias e redes
sociais digitais, as redes cotidianas mediadas pela tradição oral do seu povo,
dos poetas populares, dos cantadores, do artesanato e da feira no mercado
público. E mesmo sendo um polo de desenvolvimento da região preserva
importantes manifestações tradicionais da cultura nordestina, a sua culinária,
o jeito hospitaleiro do patoense receber, a luta contra as adversidades do
tempo, suas festas religiosas e profanas. Patos é assim, sempre presente na
minha história de vida e na minha memória.
Parabéns
Morada do Sol pelos seus 114.
quinta-feira, 5 de outubro de 2017
As Festas aos Reis Negros no Seridó Nordestino
Três importantes festas à
Nossa Senhora do Rosário, padroeira dos negros no Brasil, são realizadas há
mais de cem anos no mês de outubro, em Pombal e Santa Luzia na Paraíba e em
Caicó no Rio Grande do Norte. As três cidades, localizadas no Sertão
nordestino, na Microrregião do Seridó paraibano (Pombal/Santa Luzia) e
norteriograndese (Caicó), foram importantes núcleos urbanos no período da
expansão da agricultura e pecuária na região.
Os negros foram levados como
mão-de-obra para as fazendas ribeirinhas do Semiárido para trabalharem na
criação de gado e principalmente no plantio do algodão, o ouro branco do Vale do
Seridó, assim denominado pela sua qualidade e boa aceitação no mercado externo.
Portanto, segundo Roberto Benjamin no livro a Festa do Rosário de Pombal:
Concentração na comunidade Pitombeira |
A presença negra no sertão deveu-se ao Ciclo do Algodão. Introduzido na periferia da zona canavieira, nas terras menos úmidas, o algodão, no século passado, com a revolução industrial e a Guerra Civil americana, tornar-se-ia um produto nobre de exportação no Brasil. Pouco a pouco a lavoura algodoeira foi penetrando e acabou por fixar-se em terras do sertão. (BENJAMIN, 1976)
Cavalgada rumo à Santa Luzia |
Com a presença do negro nessas localidades
vieram também a devoção a Nossa Senhora do Rosário e suas manifestações
culturais tradicionais que continuam presentes nas mais diferentes atividades
socioculturais, econômicas, religiosas e profanas. As festas à Nossa Senhora do
Rosário são um marco importante da religiosidade e da cultura popular tradicional
nas comunidades negras do Seridó nordestino onde foi significativa a
agricultura do algodão, que teve grande importância na economia da região.
Em Pombal a festa do Rosário
é realizada na primeira semana de outubro.
Em Santa Luzia sempre acontece na
segunda semana e em Caicó na última semana do mesmo mês. Como quase todas as
festas de padroeiros e padroeiras as de Nossa Senhora do Rosário, nestas
localidades, têm o seu novenário, as missas, procissões, hasteamento das
bandeiras, quermesses, parques de diversões, bailes populares, mas se destacam
pelas ricas manifestações folclóricas.
Cavalgada |
O que as diferencia das
demais festas é o cortejo real dos grupos de danças caraterísticos dessas festas
dos reis negros. O cortejo quase sempre é constituído por juiz da irmandade do Rosário,
reis, rainhas, vassalos, grupos dos pontões, pelas bandas de cabaçais e os
grupos dos congos.
Cavalgada chega à cidade Santa Luzia |
Durante um longo período,
sempre acompanhado pelo professor e pesquisador Roberto Benjamin, realizamos pesquisas
etnográficas nas três localidades e registramos diferentes momentos dessas
festas observando as singularidades de cada uma delas.
A festa do Rosário em Pombal
é diferente da festa em Santa Luzia que também diferente da de Caicó. Portanto,
quero aqui destacar o cortejo do Tope do
Juiz, um dos momentos mais significativos da festa do Rosário em Santa
Luzia o que a torna diferente das outras duas.
O Tope do Juiz na Festa do
Rosário em Santa Luzia
Juiz da Irmandade do Rosário |
A cidade de Santa Luzia fica
às margens da BR-230 a uma distância de aproximadamente 270 quilômetros de João
Pessoa, a capital do Estado da Paraíba, e cerca de 40 quilômetros de Patos, um
importante polo econômico do Sertão paraibano. A cidade de Santa Luzia tem
fácil acesso por automóvel e várias alternativas de ônibus, tem um hotel de
porte médio com acomodações simples, mas aconchegantes.
Pontões recebem a Corte Real |
É uma boa opção para
quem desejar conhecer uma da mais tradicionais festas de Nossa Senhora do
Rosário aqui na Paraíba e que acontece neste final de semana.
Portanto, conforme a
tradição local, nos próximos dias 7 e 8 a Festa de Nossa Senhora do Rosário em
Santa Luzia chega ao seu ponto mais significativo com a saída do Juiz da
Irmandade do Rosário, em cortejo pelas principais ruas em direção à igreja matriz
da cidade.
Pontões abrem passagem para o Cortejo Real |
O Tope do Juiz, assim denominado pela
tradição popular, tem início com uma concentração, logo nas primeiras horas da
manhã do sábado, na comunidade de Pitombeira uma reminiscência de um quilombo
localizado no município de Várzea, que fica a uma distância de 15 quilômetros
de Santa Luzia. O juiz sai em cortejo da comunidade de Pitombeira acompanhado
por um grande número de vaqueiros até a entrada da cidade de Santa Luzia onde
se encontra com o cortejo real, o grupo dos pontões, a banda de cabaçal, as
autoridades públicas, civis, eclesiásticas e o povo em geral.
Cortejo com a Banda Cabaçal |
Depois de receber a benção e as saudações das
demais autoridades o cortejo segue pelas principais ruas da cidade até a igreja
matriz de Santa Luzia. Durante grande parte do dia o cortejo sempre acompanhado
pelos cavaleiros, banda de pífanos, os grupos de danças e o povo percorrem
diversas ruas visitando as casas que oferecem comidas e bebidas à comitiva
real. E assim é o Tope do Juiz na
Festa de Nossa Senhora do Rosário em Santa Luzia, uma tradição de 142 anos.
Cortejo Real |
Cortejo Real |
Cortejo Real |
quarta-feira, 6 de setembro de 2017
Folclore: dinâmica e transformações na contemporaneidade
Clerton Martins (CE) |
Esse foi o tema central do VIII Seminário Nacional de Folclore, realizado na cidade de Fortaleza nos dias 24, 25 e 26 de agosto de 2017, evento promovido pela Comissão Cearense de Folclore-CCF com o apoio da Comissão Nacional de Folclore-CNF. O Seminário reuniu folcloristas, estudiosos e pesquisadores de diferentes estados brasileiros que discutiram sobre as problemáticas atuais que cercam as comunidades tradicionais populares e seus fazeres e saberes nas mais diversas formas de conhecimento, considerando as suas características interdisciplinares dos estudos e das pesquisas desenvolvidas no campo do folclore e da cultura popular.
Eleonora Gabriel (RJ) |
Trigueiro (PB), Paula (RS), Toninho (SP) |
Durante o evento professores, folcloristas, alunos e demais pesquisadores de áreas afins debateram o folclore na contemporaneidade, possibilitando a compreensão de novos paradigmas, a dinamização, os estudos e as pesquisas cientificas.
Os conferencistas, palestrantes, debatedores, moderadores e as intervenções dos demais participantes contribuíram, de forma sistemática, para uma melhor reflexão sobre o desenvolvimento dos estudos e das pesquisas do folclore e da cultura popular no contexto da dinâmica e das transformações na contemporaneidade.
Severino Vicente (CNF) |
Severino Vicente, presidente da Comissão Nacional de Folclore, sobre a realização do seminário afirmou:
“O VIII Seminário
Nacional de Folclore em Fortaleza estruturou-se dentro de uma visão do mundo
moderno, mas atuando firmemente em defesa dos valores da Cultura Popular, da
liberdade de suas criações e recriações numa sociedade em acelerado processo de
transformação. A temática por si fala: Folclore: Dinâmica e Transformação na
Contemporaneidade. Estas foram as linhas que nortearam o VIII Seminário e que
deverá ter continuidade, fortalecido pelas Comissões estaduais de folclore e
estudiosos do folclore brasileiro, com suas preciosas contribuições num esforço
conjunto, na corrida pela salvaguarda de nossas ricas matrizes culturais,
componentes primordiais na formação da nacionalidade. O Seminário foi um
sucesso e a Comissão Cearense cada vez mais fortalecida com toda sua equipe”.
A presidente da Comissão Cearense de Folclore, Poliana Santos, ao comentar sobre o evento afirma:
“O VIII Seminário Nacional de Folclore teve como objetivo principal conhecer e reconhecer os estudos relacionados aos saberes tradicionais uma vez que atua diretamente com a percepção e contribuição de agentes de instituições educacionais e culturais dos diversos recantos do Ceará e do Brasil. O evento oportunizou aos participantes um contato maior com grupos portadores de tradição entre eles o Maracatu Nação Pici, Boi Juventude e o Afoxé Oxum Odolá. As instituições parceiras, Associação Cultural Canto da Jandaia, Instituto Nordeste e Cidadania, Editora Dinâmica, Instituto Dragão do Mar através da Secretaria de Cultura do Estado do Ceará”.
Mazoco (ES), Gutemberg (RN), Dionísio (SP), Francisco (SC) |
Cacique Pequena, Cacique Venâncio, Mestre Luís, Weber (CE) |
No seminário realizaram-se palestras, mesas de debates e atividades culturais e tudo aconteceu no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura. As palestras abordaram temas como “Folclore: dinâmica e transformações na contemporaneidade" e, "Máscaras: do teatro ritual ao teatro brincante”. Nas mesas e nos debates foram abordados temas como: "Saberes e fazeres na docência", "Estado e políticas públicas para o folclore hoje", "Povos indígenas na contemporaneidade", "Festas tradicionais do Divino", "Africanidade, questões contemporâneas" e a mesa que encerrou o seminário teve como tema a "Comissão Nacional de Folclore-CNF: sua criação, importância e novos rumos".
Na solenidade de encerramento a presidente Poliana Santos e o presidente Severino Vicente ressaltaram a importância dos temas abordados no seminário e das estratégias para dar visibilidade às ações da Comissão Nacional de Folclore, em sintonia com as
comissões estaduais em todo o território nacional, inclusive utilizando as ferramentas digitais disponíveis nas redes sociais.
Lélia (SC), Lilia (SP, Neide (SP) |
O presidente Severino Vicente submeteu à assembleia a concessão da medalha de Folclorista Emérito, aprovada por unanimidade para Lourdes Macena, professora, pesquisadora, ex-presidente da Comissão Cearense de Folclore e ex-presidente da Comissão Nacional de Folclore; para Maria Valquíria Mendes, professora, pesquisadora e ex-presidente da Comissão Cearense de Folclore e para Walden Luiz Furtado Bezerra, ator, diretor teatral, pesquisador e ex-presidente da Comissão Cearense de Folclore.
Leno (CE) Joila (MA), Willian (CE) |
Em seguida a assembleia aprovou menções de pesar pelo falecimento do professor e pesquisador Braulio Nascimento, presidente de honra da Comissão Nacional de Folclore; do professor e pesquisador Domingos Diniz, ex-presidente da Comissão Mineira de Folclore e para o professor, pesquisador e ex-presidente da Comissão Nacional de Folclore, Ático Villas-Boas da Mota.
Na parte cultural se apresentaram vários grupos folclóricos do Ceará e aqui destacamos os grupos Maracatu Nação Pici, Boi Juventude e o Afoxé Oxum Odolá que, com curtas apresentações, exibiram as suas músicas e danças numa pequena amostra da diversidade do rico folclore cearense. Parabéns à Comissão Cearense de Folclore e toda a equipe organizadora do evento, à Comissão Nacional de Folclore pelo apoio e aos dez presidentes de comissões estaduais e municipais de folclore que colaboraram para o sucesso do seminário.
Ganhadores da Medalha Folclorista Emérito |
Presidente da CNF e Secretário Estadual de Cultura (CE), pré coroação da rainha do Maracatu |
quarta-feira, 2 de agosto de 2017
A Festa das Neves em Portugal
Em agosto, no dia cinco, acontece uma das
mais importantes festas em homenagem a Nossa Senha das Neves, em Portugal, na localidade
denominada de Largo das Neves, um espaço de convergência das freguesias de Villa
Punhe, Mujães e Barrosela, denominado também, de Triângulo das Neves pertencente
ao Distrito e a Diocese de Viana do Castelo. A cidade de Viana do Castelo,
localizada no norte de Portugal, fica a cerca de 70 quilômetros do Porto e 390
de Lisboa, é rica em patrimônio cultural material e imaterial.
Mas é a romaria de Nossa Senhora d’Agonia, sem
dúvida nenhuma, a maior e mais importante festa popular da região, que se
realiza na segunda quinzena de agosto no Conselho de Viana do Castelo.
Essa Festa das Neves tornou-se popular a
partir de 1634 quando se espalharam por Portugal as capelas em devoção ao culto
mariano.
Conforme a tradição oral a Festa das Neves
foi criada como pagamento de promessas do um imigrante português, João Pires
Ramalho, retornado do Brasil e como fundador da Casa da Torre das Neves funda
também uma capela em devoção a Santa Maria das Neves. A capela passou por
períodos de decadência até ser reconstruída pela piedade barroca e a partir de
1657 as missas semanais e as romarias no dia 5 de agosto eram frequentadas por
devotos de várias localidades da região polarizada por Viana do Castelo,
principalmente das três freguesias, Villa Punhe, Mujães e Barrosela.
O historiador português Alberto Abreu, no seu
livro sobre Auto da Floripes na Festa das Neves diz:
“Em 1859 refere o Almanach de lembranças luso-brasileiras que a romaria atraía “centenares
de romeiros de todos os arredores”. A atracção popular tinha uma motivação
acrescida na concessão de indulgências. Com efeito, o papa Pio IX concedeu à
capela de Nossa Senhora das Neves o privilégio de altar, que concedia uma
indulgência plenária aplicável ao defunto por cuja alma fosse celebrada uma
missa no altar principal desta capela. Mas foi já no início do século XX que a
capela foi refeita, em 1907, e inaugurada a reconstrução em 1908” (ABREU, 2001,
p. 21).
No início do século XX a
Festa das Neves toma um caráter religioso e profano com novenário, procissão, romarias,
manifestações folclóricas e quermesses com os tradicionais comes de bebes. Uma das
atrações da festa é a encenação do Auto
da Floripes, aguardada com grande expectativa pela população do Lugar das
Neves e seus entornos.
O Auto da Floripes
Nas festas religiosas e profanas em Portugal podemos
observar importantes manifestações tradicionais que têm as suas origens na
Idade Média e entre tantas outras tradições que persistem são as várias versões
das batalhas entre cristãos e mouros comandadas pelo imperador Carlos Magno. As
inúmeras representações dos feitos de Carlos Magno são narradas nos folguedos,
nas danças, nas músicas, na literatura e no teatro popular português e aqui no
Brasil chegaram nas caravelas e continuam presentes nas nossas tradições
culturais.
O Auto da Floripes é uma narrativa teatral
popular do ciclo carolíngio, espetáculo que conta a história das batalhas entre
cristãos e mouros encenadas por populares no Largo das Neves durante a Festa de
Nossa Senhora das Neves. A encenação, a estrutura e os diálogos do espetáculo desenvolve-se,
há centenas de anos, com o mesmo objetivo, contar a história da derrota dos
mouros pelos Doze Pares de França comandados pelo Imperador Carlos Magno. O
Auto da Floripes é uma criação popular e encenada há centenas de anos pelo povo
das três freguesias vianenses.
Como quase toda a manifestação da cultura
popular, aqui e ali, o Auto da Floripes passa por processos de atualizações
introduzindo novos elementos ao espetáculo. Alberto Abreu, sobre as inovações
na encenação do Auto da Floripes, citando Cláudio Basto, transcreve: “Em 1933,
porém, os soldados cristãos envergavam fardas brancas, trazidas por um
brasileiro dum carnaval carioca”. Mas, segundo Abreu a inovação não pegou e os
fardamentos dos soldados cristãos voltaram à moda tradicional. Mesmo assim, no
decorrer do tempo, outras inovações são introduzidas nas indumentárias e no
texto, conforme a dinâmica cultual.
O Auto da Floripes narra a história da
derrota dos mouros pelos cristão, do bem contra o mal, de amor e ódio, com as
cores predominantes do vermelho, do azul, do amarelo e do cinza nas indumentárias
e cada uma tem o seu simbolismo para diferenciar os cristãos dos mouros. Carlos
Magno, Ferrabrás, Roldão, Balaão, Oliveiros, Floripes, Soldados cristãos e
mouros, Brutamontes e outros atores do povo, que vivem com entusiasmo cada
personagem do espetáculo carinhosamente assistido pela população de Villa Punhe,
Mujães e Barrosela e outras localidades que se concentram no Largo das Neves no
5 de agosto, dia da Festa da Neves em Portugal. (Acesse aqui o vídeo do Auto da
Floripes).
João Pessoa, a capital do Estado da Paraíba, completa este ano 432 anos e, no dia 5 de
agosto celebra a festa de sua padroeira Nossa Senhora das Neves, que ocorre há
centenas de anos, cada vez mais desprestigiada pelas autoridades e parte da
sociedade local, mesmo sendo uma das mais antigas festas religiosas e profanas
do Brasil.
Por onde ando, especialmente fora do Brasil,
vejo o ressurgimento das festas religiosas e profanas em homenagem aos padroeiros
e padroeiras das cidades. A tradicional Festa das Neves em João Pessoa continua
enraizada na nossa memória e na tradição cultural não só dos pessoenses mas dos
paraibanos.
Precisamos de um João Pires Ramalho que ao
retornar do Brasil para a sua terra Portugal incentivou a piedade popular de
Nossa Senhora das Neves em Viana do Castelo.
Agradeço aos amigos estudiosos do folclore
português Alberto Abreu e Alberto Rego pelas informações sobre a Festa das
Neves e o Auto da Floripes.
Referências
ABREU,
Alberto A. O Auto da Floripes no imaginário minhoto. Viana do
Castelo\Portugal: Câmara Municipal, 2001.
Memoria
Media. Registro Integral do Auto da Floripes em 2016. Vídeo disponível no You
Tube <https://www.youtube.com/watch?v=guJwUzQwnoU > Acesso em 2 ago. de 2017.
quinta-feira, 20 de julho de 2017
As festas tradicionais e os diferentes processos de atualização
O meu amigo Wills Leal (escritor, pesquisador das nossas festas tradicionais e membro da Academia Paraibana de Letras e da Academia Paraibana de Cinema), telefonou para mim demonstrando a sua preocupação com a “invasão” das músicas sertanejas nas nossas festas juninas, mais precisamente no “Maior São João do Mundo”, que se realiza em Campina Grande, a segunda cidade mais importante do Estado da Paraíba. E Wills chamava a atenção para os debates surgidos no período das festas, contra e a favor desse gênero musical, para não se deixar que esses debates caíssem no esquecimento com o final dos festejos juninos, com toda razão.
É realmente um tema bastante polêmico que necessita de ampla reflexão ouvindo todas as partes envolvidas na organização dessas festas juninas institucionalizadas pelos poderes municipais e empresas privadas em que os interesses extrapolam as nossas tradições culturais. Ressalto que não comungo com a ideia que tradição seja uma experiência patológica ligada ao passado e que rejeita toda e qualquer experiência inovadora, toda e qualquer experiência de atualização.
Assim como no Brasil em outras partes do mundo as festas religiosas do catolicismo popular também passam por importantes atualizações como parte dos processos das dinâmicas culturais. Mas, é inegável a forte influência dos diferentes grupos empresariais e políticos nesses processos de atualizações dessas festas tradicionais.
Aqui gostaria de distinguir tradição de antiguidade, de coisa que é velha, porque são realidades diferentes, não olhar o antigo como coisas que sempre ficaram para trás, que ficaram só na memória, até porque nem tudo que é tradicional é velho, assim como nem tudo que é moderno é novo.
Portanto, as manifestações culturais tradicionais estão em constantes processos de atualização. Na realidade o que existe são processos tensos de negociações entre tradição e atualidade, entre o local e o global, que sempre conviveram nas diferentes épocas da história.
Toda e qualquer manifestação cultural tradicional traz, inevitavelmente, alguma coisa de novo na atualidade, é assim que venho observando as festas populares e não seria diferente com os festejos juninos aqui no Brasil e especialmente no Nordeste onde são celebrados com maior intensidade.
É quase impossível compreender e estudar as festas tradicionais fora do contexto da globalização cultural e, consequentemente, dos interesses da sociedade midiatizada, até porque as festas tradicionais estão, cada vez mais, agregando bens culturais produzidos pela mídia, pelo turismo e pelos interesses dos grupos políticos. Da mesma forma a mídia agrega bens culturais produzidos pelas sociedades tradicionais visando interesse dos seus negócios de compra e venda de bens culturais. E é nesses campos híbridos e tensionados que emergem as manifestações culturais tradicionais na atualidade.
As festas tradicionais convivem com as atualizações de bens culturais da sociedade tecnológica e globalizada, mas quando são apropriados e incorporados através dos processos de ressignificações operados pelos ativistas midiáticos nas redes folkcomunicacionais são, quase sempre, assentados nas experiências passadas de gerações em gerações e não como uma mera aceitação imposta de fora para dentro.
Ou seja, através dos seus atores sociais – brincantes – as manifestações culturais tradicionais se apropriam e incorporam, através das mediações negociadas, bens culturais inovadores como partes dos processos de atualizações. Um desses exemplos nas festas de São João aqui no Nordeste são as quadrilhas juninas que passaram e passam por significativas atualizações, mas são produzidas pelos ativistas midiáticos operadores nas redes folkcomunicacionais e por isso mesmo continuam estruturadas nas suas tradições culturais.
Quando esses processos de atualização das manifestações culturais tradicionais são impostos por setores externos às redes de sociabilidades das comunidades fazedoras das festas, aí sim é necessário ter uma certa cautela, uma certa preocupação com esses movimentos de apropriações, que quase sempre são passageiros, estão simplesmente na moda como bola da vez e que se diluem no tempo efêmero da sociedade midiatizada.
Aqui me refiro a festas tradicionais como acontecimentos identificadores dos fatos locais, como celebrações simbólicas das diversas relações sociais vivenciadas por uma comunidade para lembrar o seu calendário comemorativo religioso e civil. Mas, também me preocupam as invenções das festas institucionalizadas por setores externos como as recentes PPP (Parcerias Público-Privadas), criadas para organizar e promover o maior “São João do Mundo”.
Portanto, as festas tradicionais, rurais, urbanas e rurbanas, sempre passaram e continuam passando por importantes atualizações, num passado remoto com a instituição da quaresma, depois com a invenção da imprensa móvel, com os grandes descobrimentos do século XVI, com a revolução industrial, só para citar alguns períodos importantes marcantes da nossa história.
As nossas festas tradicionais são cada vez mais influenciadas pela globalização cultural, pelas redes midiáticas que encurtam o tempo entre as distâncias da produção e veiculação de novos bens culturais, quase sempre de sucesso transitório, assim como a música de Michel Teló “Ai Se Eu Te Pego” que foi grande sucesso em anos anteriores nas festas juninas. Mas “Asa Branca” de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, gravada há mais de 70 anos, continua sendo tocada, cantada e enraizada no repertório de várias gerações.
Volto a dizer que esses processos de atualizações das festas tradicionais não são exclusivos aqui no Brasil, vêm acontecendo em várias partes do mundo. Mas mesmo com todos esses aparatos tecnológicos da informação e da comunicação social não é possível eliminar os paradigmas tradicionais de comunicação, cada vez mais operados por diferentes ativistas midiáticos nas redes folkcomunicacionais. Por isso haverá sempre, de uma ou de outra forma, interpelações e resistências locais às atualizações impostas por setores externos às comunidades fazedoras das festas tradicionais não como xenofobismo, mas como processo de aceitação ou não das imposições inovadores veiculadas pela mídia na atualidade.
A polemica sobre as descaraterizações das festas tradicionais sempre existiu e continuará existindo. É instigante o debate com diferentes opiniões, com as divergências sobre as tradições culturais e os processos de atualização.
Dito isso chamo atenção, principalmente, para a polêmica sobre o agora protagonismo dos cantores e cantoras da música sertaneja e o agora papel coadjuvante dos cantores e cantoras do nosso tradicional forró nos processos de atualizações das festas juninas no Nordeste promovidas por grupos empresariais e políticos, principalmente com a PPP na organização e promoção do “Maior São João do Mundo” em Campina Grande que são, quase sempre, descompromissados com as nossas tradições culturais e mais interessados nos negócios lucrativos das festas.
Há mais de dez anos os professores Luiz Custódio e Roberto Faustino, com a sua competente equipe composta de alunos e funcionários, organizam no mês de junho em Campina Grande o seminário: “Os Festejos Juninos no Contexto da Folkcomunicação”, promovido pelo Departamento de Comunicação Social da Universidade Estadual da Paraíba-UEPB. Aqui vai uma sugestão ou até mesmo uma provocação para eles: promover um encontro para discutir, especialmente, as mudanças nos festejos juninos com a intervenção das Parcerias Público-Privadas (PPP).
Até breve.
quarta-feira, 14 de junho de 2017
Com todo respeito às festas juninas
Parque do Povo - Campina Grande/PB |
Estamos em junho, o mês das festas dos santos populares, Santo Antônio, São João e São Pedro, celebradas há centenas de anos pela igreja católica em várias partes do mundo. Andando por aí, nas minhas observações das tradicionais festas religiosas e profanas em diferentes regiões do Brasil e fora dele, registrei vários momentos das festas do ciclo junino e fiquei impressionado com a demonstração de fé dos católicos para com os seus santos de devoção, mesmo com as significativas mudanças por que passam esses festejos, atualmente, proporcionadas pela sociedade midiatizada e da globalização cultural.
Os tempos e espaços profanos ocupam cada vez mais os territórios das tradicionais festas religiosas em todo mundo católico e nas nossas observações, aqui no Brasil, constatamos que são maiores essas ocupações territoriais do profano nas tradicionais celebrações do catolicismo popular.
Lisboa - Portugal |
Um exemplo evidente são as festas do ciclo junino no Nordeste, quando o dia dos namorados festejado no dia 12 de junho, véspera do dia de Santo Antônio, é mais lembrado e comemorado que o dia 13 de junho, evidentemente que há uma relação direta já que uma das virtudes de Santo Antônio é a de ser casamenteiro, o santo dos namorados o que motiva o aquecimento dos negócios com as trocas de presentes entre os casais apaixonados que, de uma ou de outra forma, faz parte das tradições dos festejos de Santo Antônio.
Mesmo com o grande interesse da mídia, dos promotores de eventos culturais, dos grandes empreendimentos dos negócios de bebidas, do turismo e do poder público que se apropriam das tradicionais festas populares e as transformam em eventos empresarias ou em seus projetos políticos, podemos perceber que determinados setores da sociedade já estão optando por realizar as suas festas juninas nos bairros, nas ruas e até mesmo em casa com a família como eram realizadas antigamente e como uma alternativa as festas demarcadas em determinados territórios institucionalizados pelos poderes públicos, assim como acontece no Parque do Povo em Campina Grande/PB.
Ou seja, uma festa espontânea organizada pela comunidade para brincar o São João e uma outra festa, como um mega evento organizado pelos setores empresariais interessados nos negócios comerciais e dos interesses dos políticos.
Será mesmo verdade que as nossas festas juninas estão cada vez mais parecidas com as festas de rodeio onde predominam as músicas sertanejas? Não posso afirmar isso, agora é dar tempo ao tempo para uma melhor avaliação.
Mas, com todo respeito, nada contra a música sertaneja, nada contra o forró estilizado ou eletrônico, mas cada qual no seu tempo e espaço. Na atualidade o nosso forró está ficando em segundo plano nas festas juninas, assim um pouco de lado apenas para justificar a participação de alguns artistas consagrados do forró tradicional no palco principal da festa, mas as grandes atrações são as estrelas da música sertaneja e não estou só falando do “Maior São João do Mundo”.
São João em Braga - Portugal |
Com todo respeito, espero que as festas juninas organizadas por empresários promotores de eventos culturais e pelos poderes públicos municipais não enveredam por caminhos que levaram a falência dos carnavais fora de época que se espalharam pelo Brasil afora como um pacote já pronto para vender "igualzinho" em várias localidades sem respeitar as diversidades culturais de cada região e que em pouco tempo cansou, esvaziou o modelo e foi rejeitado pelo povo.
Com todo respeito, nada contra as festas organizadas pelos empresários, pelos poderes públicos ou pela mídia, ao contrário, foram esses segmentos que juntos nos anos 80 do século passado, revitalizaram, instituíram e inventaram um modelo de festa junina tipicamente rural transportando para a área urbana do Parque do Povo, em Campina Grande a segunda maior cidade do Estado da Paraíba e importante polo econômico e sociocultural da região nordestina.
Registro das Festas Juninas |
Com todo respeito, acompanho há anos as festas dos santos populares, Santo Antônio, São João e São Pedro, como sertanejo que sou, mas também como um observador tentando entender os processos de atualização das festas tradicionais. Prova disso são os meus testemunhos publicados nos artigos que escrevo e que estão disponíveis nas redes sociais.
Portanto, o “Maior São do Mundo”, foi criado como atração turística, como um espetáculo para a divulgação da gastronomia típica da época junina, das crenças e superstições em torno das tradicionais fogueiras acesas em devoção aos santos populares e especialmente para a valorização e divulgação da música nordestina, do nosso forró.
Com todo respeito, viva o São João!!!
Álbum fotográfico
Fotos: Osvaldo & Rosinha Trigueiro
Quadrilha Junina, João Pessoa-PB |
Parque do Povo, Campina Grande-PB |
Parque do Povo, Campina Grande-PB |
São Pedro, Capela cenográfica -Campina Grande-PB |
Festa de São João, Valongo - Portugal |
Valongo - Portugal |
Valongo - Portugal |
Valongo - Portugal |
São João, Braga - Portugal |
Cabeções no São João de Braga - Portugal |
Cabeções no São João de Braga - Portugal |
Cortejo - Dança do Rei David, São João de Braga - Portugal |
Dança do Rei David |
Dança do Rei David - Braga - Portugal |
Marchas de Santo António, Lisboa - Portugal |
Marchas de Santo António, Lisboa - Portugal |
Marchas de Santo António, Lisboa - Portugal |