domingo, 24 de junho de 2012

Repercussão do post A Festa dos Bugios


O artigo “A Festa dos Bugios: uma celebração carnavalesca do São João em Portugal” tem repercussão internacional e é destaque no Blog oficial da Casa dos Bugios.
O professor doutor, pesquisador e dirigente da festa de Sobrado, Manuel Pinto, destaca: "Talvez a mais extraordinária Festa de São João e uma das mais expressivas manifestações da cultura popular portuguesa" - é assim que classifica a Festa de Bugios e Mourisqueiros um dos maiores actuais especialistas de culturas populares do Brasil, que esteve em Sobrado na festa de 2011.”

quinta-feira, 21 de junho de 2012

Quadrilhas Juninas e as Festas dos Santos Populares

Chega a época das festas juninas no Brasil e continua a polêmica sobre as apresentações das quadrilhas nos festivais e encontros promovidos por órgãos públicos ou privados, se são tradicionais, se são estilizadas, se estão mais parecidas com as escolas de samba do Rio de Janeiro ou mesmo com blocos de carnaval. Não importa o que seja, mas que são apresentações que atraem público, elevam a autoestima dos seus brincantes, na maioria jovens que moram nas periferias das grandes cidades, disso tenho certeza, principalmente, depois que venho observando a evolução desses grupos organizados para celebrar os santos populares do mês de junho: São Antônio, São João e São Pedro.   
Os festivais, os encontros de quadrilhas juninas se espalham por quase toda a região nordestina como um novo espetáculo e todo o espetáculo tem três componentes fundamentais: o espaço, o tempo e o movimento de apresentação. Mas, na sociedade contemporânea emerge um quarto componente importante, o midiático, que quase sempre determina um novo espaço, um novo tempo e um novo movimento para as apresentações dos espetáculos, especialmente para as transmissões da televisão ao vivo, aliás, isso acontece no carnaval do Sambódromo, no festival do Boi em Parintins, na festa de Rodeio em Barretos e em tantas outras festas populares brasileiras.

Evidentemente as festas juninas no Nordeste não poderiam ficar de fora do jogo de interesse da mídia e principalmente da televisão.  Antes de criticar as atuais quadrilhas é necessário conhecer quais são as origens das nossas festas populares, de onde vieram as nossas manifestações culturais tradicionais, como surgiram na Península Ibérica e como chegaram no Brasil. São questionamentos que necessitam de melhores reflexões dos estudiosos, dos pesquisadores e dos agentes responsáveis pela administração das políticas públicas para as culturas tradicionais, por que o povo está interessado mesmo é em festejar e celebrar esses santos populares. 

Sabe-se, através da história, que na Idade Média os povos celebravam festas para os deuses pagãos nas mudanças das estações do ano, no antigo Egito em homenagem a deusa da castidade Isis, em Roma ao deus do vinho Baco e assim foram se espalhando as festas dionisíacas, lupercais, saturnais, charivaris ou assuadas que eram festas com suas inversões dos valores morais, com os cortejos jocosos, das alegorias e das extravagâncias. Ou seja, as festas das mudanças de estações do ano, que predominaram na Europa Antiga por longos períodos, quase sempre foram espetáculos de carnavalizações, das fantasias grotescas, com muitas cores, irreverências e de personagens patéticas. A passagem da primavera para o verão é a melhor época para a colheita das plantas mágicas com seus poderes de cura e nesta agenda de festividades, das crenças populares estavam as comemorações ao solstício de verão no hemisfério norte e aqui chegavam  com os colonizadores em forma de festa religiosa e profana não mais para comemorar a mudança de estação, achegada do inverno no hemisfério sul, que sempre ocorre entre os dias 20 e 24 de junho, mas para celebrar os santos católicos: Santo Antônio, São João e São Pedro. 

Portanto, não basta fazer crítica, é necessário entender a evolução das nossas festas populares, situá-las nos diferentes contextos socioeconômicos, nos espaços/tempos/movimentos do público e privado, da casa e da rua, cada vez mais influenciada pela sociedade midiática. Com a globalização cultural ao invés da propalada extinção das culturas tradicionais o que estamos vendo são suas ressignificações para atender as demandas de consumo de bens culturais, para o turismo e para a mídia, com suas formas hibridas do global/local. Aqui chamo atenção para as quadrilhas juninas como um espetáculo popular em evolução, com torcidas organizadas e que atraem grandes públicos nas suas apresentações.

Este ano o concurso de quadrilhas juninas de João Pessoa ocorre na praça Dom Adauto, mais conhecida como a praça do Bispo. Durante três noites mais de 20 grupos se apresentam e as três primeiras classificadas disputam o campeonato paraibano que será realizado no Parque do Povo, em Campina Grande.

E em festejos juninos não pode faltar forró nos seus diversos gêneros: pé-de-serra, universitário, de plástico e eletrônico entre outros. É nesse “ritmo” que participarei da banca examinadora da defesa de dissertação da mestranda Libny Silva Freire na Universidade Federal do Rio Grande do Norte.


quinta-feira, 14 de junho de 2012

A Festa dos Bugios: uma celebração carnavalesca do São João em Portugal

Cartaz da Festa "Bugiada 2011"
A origem das festas juninas tem como base duas hipóteses defendidas por folcloristas e outros estudiosos. 

Uma é a sua vinculação direta à celebração do nascimento de São João Batista, filho de Zacarias e Isabel, precursor do Messias. 

A outra hipótese, à qual nos associamos, é a sua vinculação com as festas de origem pagã na Idade Média, pela celebração da chegada do verão no Hemisfério Norte, o solstício de verão.

Acompanho há vários anos essa polêmica entre a tradição e a modernidade dos festejos juninos no nordeste brasileiro, principalmente sobre a evolução das quadrilhas que estão cada vez mais parecidas com as escolas de samba do Rio de Janeiro e então resolvi conhecer de perto as raízes Ibéricas da festa de São João para melhor compreender tudo isso. 

Quem tem razão? As nossas festas estão realmente perdendo as suas tradições? A globalização e consequentemente a mídia são responsáveis por todas essas modificações? Para verificar tudo isso fomos a Portugal, em junho de 2011, para observar as festas de Santo Antonio, São João e São Pedro e fiquei impressionado com a participação popular nas celebrações dos três santos do mês de junho em todo o país. É realmente uma das maiores festas populares dos portugueses, tão grande ou maior que o carnaval. 

Marchas de Lisboa
Marchas de Lisboa
Em Lisboa a Festa de Santo Antonio com as Marchas Populares em grande desfile na Avenida da Liberdade, uma das mais importantes avenidas da capital portuguesa, é um acontecimento midiático transmitido ao vivo pelas principais redes de televisão com a participação das celebridades do mundo artístico que se misturam com a maioria de anônimos que fazem o espetáculo assistido por milhares de pessoas que se espalham pelas ruas da cidade. O Santo Antonio é comemorado nos diversos bairros com muita música, com forte influência da música brasileira, as tradicionais sardinhas assadas na brasa, broas de milho e vinho. Pudemos observar na Mouraria, no Alto do Pina, na Penha de França e em Alfama a demonstração de fé e alegria dos lisboetas para com o santo casamenteiro.


Mas o que mais nos chamou atenção foi a festa centenária dos Bugios do Sobrado, um pequeno distrito do município do Valongo pertencente a região metropolitana do Porto, onde se realiza no dia 24 de junho, talvez, a mais extraordinária Festa de São João e uma das mais expressivas manifestações da cultura popular portuguesa, que ainda não foi descoberta pela mídia e nem pelo turismo.
Bugiada 2011

Foi observando essa festa que passamos a compreender melhor o que está acontecendo na atualidade com as nossas festas juninas aqui no nordeste brasileiro e as suas transformações ou ressignificações, para atender as novas demandas de consumo do mundo globalizado.
Bugiada 2011


Na festa de São João do Sobrado há uma representação da luta entre mouros (os Mourisqueiros) e os cristãos (os Bugios), que desfilam pelas ruas da localidade em ritmos de marchas marciais. É uma batalha entre o bem (os cristãos) e o mal (os mouros) e como sempre nessa luta o bem vence o mal.

Na Idade Média as festas de mudanças de estação do ano eram festas carnavalescas, dos muitos mascarados que saiam às ruas praticando desordens e desrespeito às autoridades locais e tudo isso com permissão da sociedade. 
Bugiada 2011 - Mundo pelo avesso


Era a festa do mundo pelo avesso, a inversão do homem que andava no animal de costas segurando a cauda do burro, inversão do sexo, ou seja, homem vestido de mulher e mulher vestida de homem. No período dessas festas quase sempre a liberdade sexual era permitida, ou seja, valia quase tudo que não estava na ordem do dia. 
Mascarados na  Bugiada 2011

Mascarados na Bugiada 2011

É a experiência dos diferentes mundos que aflorava com maior intensidade assim como o mundo maravilhoso da Cocanha ou de São Saruê como bem relatou em versos o poeta popular paraibano Manoel Camilo. Melhor dizendo as festas das mudanças das estações do ano, mesmo que sazonalmente, eram demonstrações de contestação ao cotidiano, das críticas sociais, dos protestos as elites políticas em que o povo contrariava as determinações da Igreja. 

Corso da Bugiada 2011


Os festejos populares da estação de verão, no mês de junho no Hemisfério Norte, na Idade Média eram celebrações vinculadas aos festejos carnavalescos, principalmente as festas de Corpus Christi e São João Batista.
Na Festa dos Bugios do Sobrado em Portugal, que fica a 15 quilômetros da cidade do Porto, o que assistimos foi uma festa rural de celebração do dia de São João com fortes características dos festejos carnavalescos da Idade Média. 












Mourisqueiros da Bugiada 2011
Também na festa do Divino Espirito Santo em Pirenópolis, no Estado do Goiás/Brasil, agora no mês de maio de 2012, pudemos observar o uso de máscaras, a saída de blocos e troças que desfilavam pelas ruas da cidade com muita algazarra e críticas às autoridades civis e religiosas. 
Cavalhadas 2012


No Cavalhódromo, que fica no centro da cidade de Pirenópolis, assistimos as tradicionais e belas Cavalhadas que simbolizam a luta de mouros (o mal) e cristãos (o bem), os cordões azul e encarnado, uma batalha imaginária cujo objetivo se assemelha ao que acontece na festa centenária dos Bugios de Sobrado em Portugal. 
Melhor dizendo, na luta entre mouros e cristãos em ambas as festas o bem vence o mal, de acordo com a simbologia cristã do mundo ocidental. 
Mascarados na Festa do Divino 2012
Mascarados na Festa do Divino 2012























Assim podemos dizer que tanto as festas juninas como as festas de Corpus Christi tem as suas origens nas festas carnavalescas da Idade Média de celebração da chegada do verão no Hemisfério Norte e que chegaram com os colonizadores já adaptadas conforme determinava a religião cristã.


Mascarados na Festa do Divino 2012
E aqui vai uma pergunta, não como provocação, mas para uma melhor reflexão. Será que as transformações das nossas festas juninas e suas aproximações com as festas carnavalescas na atualidade não seriam uma reaproximação com o mundo das experiências originárias da Idade Média, mesmo que inconscientemente? Para nós que pesquisamos as manifestações das culturas populares no contexto da folkcomunicação o importante é compreender as mediações nas diferentes instâncias da sociedade e como operam os ativistas midiáticos no processo de negociação da realização da festa de São João na atualidade.  Viva o São João do  jeito que o povo gosta.
Procissão de São João na Bugiada 2011
Fotos: Osvaldo e Rosa Trigueiro